CONTRA O LATROGENOCÍDIO DO POVO LÍBIO


CONTRA O LATROGENOCÍDIO DO POVO LÍBIO



Mantemos a recomendação do vídeo de Jean-Luc Godard, com sua reflexão sobre a cultura européia-ocidental, enquanto a agressão injusta à Nação Líbia perdurar.




Como contraponto à defesa de civis pelos americanos, alardeada em quase todas as recentes guerras de agressão que promovem, recomendamos o vídeo abaixo, obtido pelo Wikileaks e descriptografado pela Agência Reuters

domingo, 13 de março de 2011

A Otan, a guerra, a mentira e os negócios, por Fidel Castro Ruz

(Extraído do CubaDebate)

COMO alguns já sabem, em setembro de 1969, Muamar Kadafi, um militar árabe beduíno, de caráter peculiar e inspirado nas ideias do líder egípcio Gamal Abdel Nasser, promoveu no seio das Forças Armadas um movimento que derrubou o rei Idris I da Líbia, um país quase na sua totalidade desértico e de população escassa, situado no norte da África, entre a Tunísia e o Egito.

Os importantes e valiosos recursos energéticos da Líbia foram descobertos progressivamente.

Nascido no seio de uma família da tribo beduína de pastores nômades do deserto, na região de Trípoli, Kadafi era profundamente anticolonialista. Afirma-se que seu avô paterno morreu lutando contra os invasores italianos quando o país foi ocupado em 1911. O regime colonial e o fascismo mudaram a vida de todos. Diz-se, da mesma forma, que seu pai esteve na prisão antes de ganhar a vida como operário da indústria.

Os adversários de Kadafi, inclusive, asseguram que ele se destacou por sua inteligência como estudante. Foi expulso da escola por suas atividades anti-monarquistas. Conseguiu inscrever-se em outra escola e depois graduou-se em Direito na Universidade de Benghazi, aos 21 anos. Mais tarde entra no Colégio Militar de Benghazi, onde criou o que foi chamado de Movimento Secreto Unionista de Oficiais Livres, concluindo depois seus estudos em uma academia militar britânica.

Estes antecedentes explicam a notável influência que exerceu depois na Líbia e em outros líderes políticos, sejam favoráveis ou não de Kadafi.

Havia iniciado sua vida política com fatos inquestionavelmente revolucionários.

Em março de 1970, após grandes manifestações nacionalistas, conseguiu a evacuação dos soldados britânicos do país e, em junho, os Estados Unidos abandonaram a grande base aérea que possuíam perto de Trípoli, entregando-a a instrutores militares egípcios, país aliado da Líbia.

Em 1970, várias empresas petroleiras ocidentais e sociedades financeiras com a participação de capitais estrangeiros foram afetadas pela Revolução. No final de 1971, a famosa British Petroleum teve a mesma sorte. No setor agropecuário, todos os bens italianos foram confiscados, os colonos e seus descendentes expulsos da Líbia.

A intervenção estatal foi orientada para o controle das grandes empresas. A produção desse país passou a desfrutar de um dos níveis mais altos do mundo árabe. Foram proibidos o jogo de azar e o álcool. O estatuto jurídico da mulher, tradicionalmente limitado, foi elevado.

O líder líbio mergulhou então em teorias extremistas, que se opunham tanto ao comunismo quanto ao capitalismo. Foi uma etapa na qual Kadafi se dedicou à teorização, que não faz sentido incluir nesta análise, embora seja necessário assinalar que, no primeiro artigo da Proclamação Constitucional de 1969, se estabelecia o caráter "Socialista" da Jamahiriya Popular Árabe Líbia.

O que desejo enfatizar é que os Estados Unidos e seus aliados da Otan nunca se interessaram pelos direitos humanos.

A grande confusão que caracterizou o Conselho de Segurança, a reunião do Conselho dos Direitos Humanos com sede em Genebra, e a Assembleia Geral da ONU em Nova York foi puro teatro.

Compreendo perfeitamente as reações dos líderes políticos envolvidos em tantas contradições e debates estéreis, dada às maquinações de interesses e problemas que devem atender.

Todos sabemos que o caráter de membro permanente, o poder de veto, a posse de armas nucleares e muitas instituições são fontes de privilégios e interesses impostos à força à humanidade. Pode-se estar de acordo ou não com muitas delas, mas não se pode jamais aceitá-las como medidas justas ou éticas.

O império pretende agora fazer girar os acontecimentos em torno ao que Kadafi fez ou não, porque necessita intervir militarmente na Líbia e golpear a onda revolucionária desatada no mundo árabe. Até agora não se dizia uma única palavra, se guardava silêncio e se faziam negócios.

Promovida a latente rebeldia líbia pelos órgãos de inteligência ianques, ou por erros do próprio Kadafi, é importante que os povos não se deixem enganar, já que a opinião mundial terá, muito em breve, elementos suficientes para saber a que se ater.

Em minha opinião, e assim expressei desde o primeiro momento, é preciso denunciar os planos da belicosa Otan.

A Líbia, da mesma forma que muitos países do Terceiro Mundo, é membro do Movimento dos Países Não-Alinhados, do Grupo 77 e outras organizações internacionais, por meio das quais são estabelecidas relações, independentemente do sistema econômico e social.

Sem entrar em pormenores: a Revolução Cubana, inspirada em princípios marxistas-leninistas e martinianos, havia triunfado em 1959, a escassas 90 milhas dos Estados Unidos, que nos impuseram a Emenda Platt e eram proprietário da economia de nosso país.

Quase de imediato, o império promoveu contra nosso povo a guerra suja, os bandos contrarrevolucionários, o criminoso bloqueio econômico, a invasão mercenária da Baía dos Porcos, apoiada por um porta-aviões e a infantaria da Marinha, pronta para desembarcar se a força mercenária obtivesse determinados objetivos.

Apenas um ano e meio depois, ameaçou-nos com o poderio de seu arsenal nuclear. Esteve a ponto de ser iniciada uma guerra dessa natureza.

Todos os países latino-americanos, à exceção do México, participaram do bloqueio criminoso que ainda hoje perdura, sem que nosso país jamais se rendesse. É importante lembrar isso para os que não têm memória histórica.

Em janeiro de 1986, esgrimindo a ideia de que a Líbia estava por trás do chamado "terrorismo revolucionário", Ronald Reagan ordenou cortar as relações econômicas e comerciais com o país.

Em março, uma força naval com porta-aviões entrou no Golfo de Sirte, em águas consideradas territoriais da Líbia, desatando ataques que destruíram várias unidades navais que portavam lança-mísseis e sistemas de radares que o país havia adquirido da União Soviética.

Em 5 de abril, uma discoteca de Berlim Ocidental, frequentada por soldados dos Estados Unidos, foi vítima de explosivos plásticos. Três pessoas morreram, duas delas militares norte-americanos e muitas outras ficaram feridas.

Reagan acusou Kadafi e ordenou à Força Aérea que desse uma resposta. Três esquadrões decolaram dos porta-aviões da 6ª Frota e de bases do Reino Unido, atacando com mísseis e bombas sete objetivos militares em Trípoli e Benghazi. Cerca de 40 pessoas morreram, 15 delas civis. Advertido do avanço dos bombardeios, Kadafi reuniu sua família e estava abandonando sua residência, situada no complexo militar de Bab Al-Aziziya, no sul da capital. Ainda não havia conseguido abandonar a casa quando um míssil atingiu a construção. Sua filha, Hanna, morreu e outros filhos foram feridos.

O ataque recebeu amplo repúdio. A Assembleia Geral das Nações Unidas aprovou uma resolução de condenação por violação da Carta da ONU e do Direito Internacional. Com termos enérgicos, da mesma forma agiram o Movimento dos Países Não-Alinhados, a Liga Árabe e a Organização da Unidade Africana (OUA).

Em 21 de dezembro de 1988, um Boeing 747 da empresa aérea Pan Am, que viajava de Londres para Nova York, se desintegrou em pleno voo por causa da explosão de uma bomba. Os restos da aeronave caíram sobre a localidade de Lockerbie e a tragédia custou a vida de 270 pessoas de 21 nacionalidades.

A princípio, o governo dos Estados Unidos suspeitou do Irã, como represália pela morte de 290 pessoas na derrubada com um míssil de um avião de sua linha aérea estatal. As investigações, segundo os ianques, implicavam dois agentes da inteligência líbia. Imputações similares contra a Líbia foram feitas pela queda de um avião da empresa aérea francesa UTA que percorria a rota Brazzaville-N’Djamena-Paris, implicando funcionários líbios, que Kadafi se recusou a extraditar por fatos que negou de forma categórica.

Uma tenebrosa lenda foi fabricada contra ele, com a participação de Reagan e George H. Bush.

Desde 1975 até a etapa final do governo de Reagan, Cuba se consagrou a seus deveres internacionalistas em Angola e outros países da África. Sabíamos dos conflitos que tinham lugar na Líbia ou em torno dela, por leituras e testemunhos de pessoas muito próximas desse país e do mundo árabe, assim como pelas impressões que guardamos de numerosas personalidades de diversos países, com as quais tivemos contato naqueles anos.

Reconhecidos líderes africanos, com os quais Kadafi mantinha relações estreitas, se esforçaram para encontrar soluções às tensas relações entre a Líbia e o Reino Unido.

O Conselho de Segurança havia imposto sanções à Líbia que começaram a ser superadas quando Kadafi aceitou submeter a julgamento, sob determinadas condições, os dois acusados pelo avião que explodiu sobre a Escócia.

Delegações líbias começaram a ser convidadas para reuniões inter-europeias. Em julho de 1999, Londres reatou as relações diplomáticas plenas com a Líbia, depois da algumas concessões adicionais.

Em setembro daquele ano, os ministros da União Europeia aceitaram revogar as medidas restritivas ao comércio, adotadas em 1992.

Em 2 de dezembro, Massimo D’Alema, primeiro-ministro da Itália, realizou a primeira visita de um chefe de governo europeu à Líbia.

Desaparecida a União Soviética e o bloco socialista na Europa, Kadafi decidiu aceitar as exigências dos Estados Unidos e da Otan.

Quando visitei a Líbia, em maio de 2001, me mostrou as ruínas do ataque traidor com que Reagan assassinou sua filha e que esteve a ponto de exterminar toda sua família.

No início de 2002, o Departamento de Estado informou que estavam em curso conversações diplomáticas entre os Estados Unidos e a Líbia.

Em maio daquele ano, os Estados Unidos tinham voltado a incluir a Líbia na lista de "Estados patrocinadores do terrorismo", embora em janeiro o presidente George W. Bush não tivesse mencionado o país africano em seu célebre discurso sobre os integrantes do "eixo do mal".

No início de 2003, por causa do acordo econômico sobre indenizações realizado entre a Líbia e os países reclamantes, Reino Unido e França, o Conselho de Segurança da ONU retirou as sanções em vigor desde 1992 contra o país africano.

Antes de se encerrar o ano de 2003, Bush e Tony Blair informaram sobre um novo acordo com a Líbia, que havia entregado a especialistas de inteligência dos Estados Unidos e do Reino Unido documentos dos programas de armas não convencionais, assim como mísseis balísticos com um alcance superior a 300 quilômetros. Funcionários dos dois países já haviam visitado diversas instalações. Era o fruto de muitos meses de conversações entre Trípoli e Washington, como revelou o próprio Bush.

Kadafi cumpriu suas promessas de desarmamento. Em poucos meses, a Líbia entregou as cinco unidades de mísseis Scud-C, com alcance de 800 quilômetros, e as centenas de Scud-B, cujo alcance ultrapassa 300 quilômetros em mísseis defensivos de curto alcance.

A partir de outubro de 2002, foi iniciada a maratona de visitas a Trípoli: Berlusconi, em outubro de 2002; José María Aznar em setembro de 2003; Berlusconi de novo em fevereiro, agosto e outubro de 2004; Blair, em março de 2004; o alemão Schröder, em outubro daquele ano; Jacques Chirac, em novembro de 2004. Todo mundo feliz. Dom Dinheiro é um poderoso cavaleiro.

Kadafi percorreu triunfalmente a Europa. Foi recebido em Bruxelas em abril de 2004 por Romano Prodi, presidente da Comissão Europeia; em agosto daquele ano, o líder líbio convidou Bush a visitar seu país; Exxon Mobil, Chevron Texaco e Conoco Philips faziam os últimos ajustes do processo de extração de petróleo por meio de joint ventures.

Em maio de 2006, os Estados Unidos anunciaram a retirada da Líbia da lista de países terroristas e o estabelecimento de relações diplomáticas plenas.

Em 2006 e 2007, França e Estados Unidos assinaram acordos de cooperação nuclear com fins pacíficos; em maio de 2007, Tony Blair voltou a visitar Kadafi em Sirte. A British Petroleum assinou um contrato "muito importante", segundo declarou, para a exploração de jazidas de gás.

Em dezembro de 2007, Kadafi realizou duas visita à França e assinou contratos de equipamentos militares e civis no valor de 10 bilhões de euros; esteve também na Espanha, onde conversou com o presidente do governo José Luis Rodríguez Zapatero. Contratos milionários foram assinados com países importantes da Otan.

O que aconteceu que, agora, há uma retirada precipitada das embaixadas dos Estados Unidos e demais membros da Otan?

Tudo é muito estranho.

George W. Bush, o pai da estúpida guerra antiterrorista, declarou, em 20 de setembro de 2001, aos cadetes de West Point: "Nossa segurança vai precisar [...] da força militar que você vão dirigir, uma força que deve estar pronta para atacar imediatamente qualquer obscuro rincão do mundo. E nossa segurança vai precisar que estejamos prontos para o ataque preventivo, quando seja necessário defender nossa liberdade [...] e nossas vidas".

"Devemos descobrir células terroristas em 60 países ou mais [...] Junto a nossos amigos e aliados, devemos nos opor à proliferação e confrontar os regimes que patrocinam o terrorismo, segundo cada caso requeira".

O que Obama pensa desse discurso?

Quais sanções serão impostas pelo Conselho de Segurança aos que mataram mais de um milhão de civis no Iraque e aos que todos os dias assassinam homens, mulheres e crianças no Afeganistão, onde nos últimos dias a população se lançou às ruas, inflamada, para protestar contra a matança de crianças inocentes?

Uma informação da AFP, procedente de Cabul, datada desta quarta-feira, 9 de março, revela: "O ano passado foi o mais letal para os civis em nove anos de guerra entre os talibãs e as forças internacionais no Afeganistão, com quase 2,8 mil mortos, cerca de 15% a mais que em 2009, indicou nesta quarta um relatório da ONU, que sublinha o custo humano do conflito para a população".

"... a insurreição dos talibãs se intensificou e ganhou terreno nestes últimos anos, com ações de guerrilha muito além dos seus lugares tradicionais do sul e do leste".

"Com exatamente 2.777, o número de civis mortos em 2010 aumentou em 15% em relação a 2009, indica o relatório anual conjunto da Missão de Assistência das Nações Unidas no Afeganistão..."

"O presidente Barack Obama expressou em 3 de março seu 'profundo pesar' ao povo afegão pelas nove crianças mortas, sendo seguido também pelo general estadunidense David Petraeus, comandante em chefe da ISAF, e pelo secretário de Defesa, Robert Gates."

"... o relatório da Unama destaca que o número de civis mortos em 2010 é quatro vezes superior ao dos soldados das forças internacionais, mortos em combate nesse mesmo ano."

"O ano de 2010 foi, de longe, o ano mais mortal para os soldados estrangeiros em nove anos de guerra, com 711 mortos, confirmando que a guerrilha dos talibãs se intensificou, apesar do envio de mais 30 mil soldados estadunidenses como reforço no ano passado."
Durante 10 dias, em Genebra e nas Nações Unidas, se pronunciaram mais de 150 discursos sobre violações dos direitos humanos, que foram repetidos milhões de vezes pela televisão, rádio, internet e imprensa.

O ministro das Relações Exteriores de Cuba, Bruno Rodríguez, em sua intervenção de 1º de março, ante os ministros das Relações Exteriores reunidos em Genebra, afirmou: "A consciência humana repudia a morte de pessoas inocentes em qualquer circunstância e lugar. Cuba compartilha plenamente a preocupação mundial pelas perdas de vidas civis na Líbia e deseja que seu povo alcance uma solução pacífica e soberana à guerra civil que ali ocorre, sem nenhuma ingerência estrangeira, e que garanta a integridade dessa nação."

Alguns dos parágrafos finais de sua intervenção foram lapidares: "Se o direito humano essencial é o direito à vida, o Conselho estará pronto para suspender a filiação dos Estados Unidos caso iniciem uma guerra?"

"Serão suspensos os Estados que financiem a forneçam ajuda militar empregada pelo Estado receptor em violações em massa, flagrantes e sistemáticas dos direitos humanos e em ataques contra a população civil, como as que ocorrem na Palestina?"

" Aplicará o Conselho essa medida contra países poderosos que realizem execuções extrajudiciais no território de outros Estados, com o emprego de alta tecnologia, como munições inteligentes ou aviões não-tripulados?"

"Que acontecerá com os Estados que aceitam nos seus territórios a existência de prisões ilegais secretas, que facilitem o trânsito de voos secretos com pessoas sequestradas ou participem de atos de tortura?"

Compartilhamos plenamente com a valente posição do líder bolivariano Hugo Chávez e da ALBA.

Estamos contra a guerra interna na Líbia, a favor da paz imediata e o respeito pleno à vida e aos direitos de todos os cidadãos, sem intervenções estrangeiras, que serviriam apenas ao prolongamento do conflito e aos interesses da Otan.



Fidel Castro Ruz

9 de março de 2011

21h35

- extraído do http://www.granma.cu/portugues/reflexoes/10marzo-A%20Otan.html, em 13/03/11

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