CONTRA O LATROGENOCÍDIO DO POVO LÍBIO


CONTRA O LATROGENOCÍDIO DO POVO LÍBIO



Mantemos a recomendação do vídeo de Jean-Luc Godard, com sua reflexão sobre a cultura européia-ocidental, enquanto a agressão injusta à Nação Líbia perdurar.




Como contraponto à defesa de civis pelos americanos, alardeada em quase todas as recentes guerras de agressão que promovem, recomendamos o vídeo abaixo, obtido pelo Wikileaks e descriptografado pela Agência Reuters

segunda-feira, 29 de novembro de 2010

Lacerda privatiza 81 bens públicos de Belo Horizonte, por Carlos Alberto Cândido

Por Carlos Alberto Cândido
Está no noticiário, mas ninguém parece ter se dado conta da importância do fato nesta cidade de imprensa submissa: o prefeito Márcio Lacerda (PSB) vai promover a maior privatização de imóveis públicos que Belo Horizonte e talvez qualquer cidade brasileira já viu. Serão 81 imóveis municipais, que irão a leilão, inclusive o Mercado Distrital da Barroca e a mansão residencial do prefeito, localizada às margens da Lagoa da Pampulha, próximo do Museu de Arte, e que tem um painel de Guignard. A informação é que o painel será retirado, mas até que isso aconteça, é melhor desconfiar.
O pior, porém, é ver dezenas de terremos desocupados, com tamanhos variando entre 1 mil e 10 mil metros quadrados, segundo notícia do Estado de Minas, se transformarem em mais espigões. Se tem uma coisa de que Belo Horizonte não precisa hoje é que áreas públicas se transformem em empreendimentos imobiliários. Muito melhor seria ver esses lotes virarem praças e parques, para lazer da população, com muitas árvores para ajudar a despoluir o ar. Ao contrário do que se diz, Belo Horizonte tem pouquíssimas áreas verdes; tem muitas árvores, mas elas estão nos passeios.
Em Belo Horizonte é impossível até andar nos passeios, tomados por lixos, lixeiras, postes, árvores, canteiros, carros e motos estacionados, obras de construção, mesas de bar, cocôs de cachorro, orelhões, caixas de correio e uma infinidade de obstáculos. Áreas públicas são uma necessidade nas grandes cidades. Quando as pessoas moram em casas, têm quintais e conhecem os vizinhos, a vida comunitária se forma assim. Quando casas são substituídas por edifícios, esse convívio desaparece juntamente com espaços privados.
É preciso, portanto, criar praças, parques, espaços de lazer, com bastante verde, para que as pessoas convivam e façam caminhadas, para que crianças brinquem e idosos possam sair dos apartamentos. O prefeito, que mora num condomínio em Nova Lima e se considera moderno, que é rico e já viajou o mundo inteiro, deveria saber disso, pois as grandes metrópoles mundiais estão preocupadas com espaços públicos. Mas não, sua política é de privatizar os espaços públicos e administrar a cidade como se fosse uma empresa lucrativa.
Foi o que fez com a Praça da Estação, cujo uso agora só se dá mediante pagamento de aluguel. Para que um artista se apresente na Praça 7, agora tem que ter alvará, como mostra notícia publicada neste portal. O prefeito gosta também de transformar áreas verdes em empreendimentos imobiliários, como está fazendo com a Mata do Isidoro, que será transformada na Vila da Copa, visando a abrigar delegações para a Copa da Fifa.
A privatização dos espaços públicos será certamente a marca do mandato do prefeito empresário, que tenta administrar Belo Horizonte como uma empresa: o que não dá lucro – cultura, por exemplo – não tem serventia. Não à toa recebeu vaia monumental do maior auditório da cidade, o Palácio das Artes, durante o Festival Internacional de Teatro (FIT), em agosto passado. Já tinha passado por isso na festa de encerramento do festival Comida di Buteco, em maio.
Empresário da cidade, o prefeito atua como auxiliar do capital, que destrói rapidamente todos os espaços vazios da cidade, derruba casas, escolas e até clubes – como acontecerá, ao que tudo indica, com o centro de lazer do América, no Bairro Ouro Preto – para erguer no lugar enormes edifícios.
É dever da prefeitura conter a especulação imobiliária, em defesa da qualidade de vida para os belo-horizontinos. Em vez disso age ela também a favor da deterioração do município. A intenção, diz a notícia, é fazer um caixa de R$ 200 milhões. O mercado vale no mínimo R$ 19,5 milhões; a casa do prefeito, R$ 1 milhão (só? Este é o preço de um apartamento na zona sul…). O governo FHC mostrou o que acontece com dinheiro de privatizações: desaparece sem trazer nenhum benefício social.
É incrível que nenhum representante dos belo-horizontinos, nenhum vereador, nenhuma organização da sociedade tenha ainda se levantado contra a realização desse crime contra o patrimônio público, movendo, inclusive, uma ação na justiça.

-extraído do Porta Minas Livre (http://www.minaslivre.com.br/artigo/prefeito-lacerda-promove-a-maior-privatizacao-de-bens-publicos-de-belo-horizonte/) em 29/11/10

sábado, 27 de novembro de 2010

Relatório do Comissário da ONU sobre Execuções Extrajudiciais, Sumárias ou Arbitrárias, Philip Alston

(tradução não oficial pelo NEV/USP, pois o português não e língua oficial da ONU)1.

Visitei o Brasil entre 4 e 14 de novembro de 2007 para investigar o fenômeno das execuções extra-judiciais. Infelizmente, muitos dos tipos de mortes que investiguei em 2007, continuaram a ocorrer em 2008. Um aspecto sobre o qual me detive foram as mortes pela polícia durante operações policiais de larga escala nas favelas do Rio de Janeiro. Conforme indico mais adiante, ainda que a operação de junho de 2007 na região do Complexo do Alemão, no Rio de Janeiro, tenha resultado na morte de 19 pessoas, as autoridades do governo do estado a consideraram como um modelo para ações futuras. Parece que, de fato, a operação se tornou tal modelo: em 30 de janeiro de 2008, seis pessoas foram mortas pela polícia em uma grande operação; em 03 de abril, 11 foram mortos; em 15 de abril, 14 foram mortos. Depois da última operação, um alto oficial da polícia comparou os homens mortos a insetos, referindo-se à polícia como “melhor inseticida social”. Estes recentes eventos destacam a continuidade e a urgente necessidade de reformas das abordagens policiais e do sistema de justiça criminal.2. Durante minha vista em 2007, eu me encontrei com vários membros de todos os escalões do governo. Também me encontrei com vários importantes representantes da área dos direitos humanos do governo e com a equipe das Nações Unidas no país. Eu recebi detalhados relatos de representantes da sociedade civil, vítimas, testemunhas e famílias de pessoas executadas. Visitei uma prisão em São Paulo, uma delegacia da Polícia Civil e um batalhão no Rio de Janeiro, uma favela no Rio de Janeiro e um assentamento em Pernambuco. Sou muito grato ao governo federal e aos governos dos estados de São Paulo, Rio de Janeiro e Pernambuco pela total cooperação a mim concedida.3. Reconheço que minha visita aconteceu dentro de um contexto de ampla preocupação da comunidade em relação à violência criminal. As cidades brasileiras enfrentam enormes desafios para garantir a seus habitantes a segurança contra violência de traficantes de drogas, armas e outras ações do crime organizado. É preciso enfatizar que a legislação de direitos humanos não apenas proíbe os governos de cometerem execuções extrajudiciais, mas também os obriga a proteger os cidadãos dos assassinos. De fato, um dos eixos centrais do conceito de direitos humanos sempre foi, não apenas o direito à vida, mas a uma vida sem medo. A segurança humana não esta em competição com os direitos humanos, mas é parte deles. No contexto brasileiro, em particular, minha investigação mostra que acabar com os abusos aos direitos humanos e assegurar uma efetiva prevenção do crime por parte da polícia estão intimamente relacionados. A principal razão da ineficácia da polícia na proteção dos cidadãos contra o crime organizado é que, com muita freqüência, a própria polícia age com violência em excesso e contraproducente e participa no crime organizado quando fora de serviço.II PREOCUPAÇÕES FUNDAMENTAIS5. Entre os maiores problemas identificados, está a alta taxa de homicídios, bem como o alto grau de impunidade. Homicídios são a principal causa de morte de pessoas com idade entre 15 e 44 anos. Já há algum tempo, entre 45 mil e 45 mil homicídios são cometidos por ano no Brasil. Apesar de essas mortes terem disseminado medo e insegurança entre a população geral, notavelmente, pouco é feito para investigar, processar e condenar os culpados na vasta maioria desses casos. No Rio de Janeiro e em São Paulo, apenas 10% dos homicídios, aproximadamente, são levados a julgamento; em Pernambuco, esse número é de aproximadamente 3%. Dos 10% dos casos julgados em São Paulo, aproximadamente 50% levam a condenação.6. Homicídios perpetrados por grupos de vigilância, esquadrões da morte e grupos de extermínio e milícias são outra grande preocupação. Em Pernambuco, uma confiável estimativa aponta que 70% de todos os homicídios são cometidos por esquadrões da morte. A atividade do esquadrão da morte geralmente consiste de policias, fora de horário, envolvidos em (a) mortes por encomenda; (b) extorquir dinheiro da população, geralmente sob ameaça de morte; e (c) assassinatos ou ameaças de assassinatos em nome de proprietários de terra contra trabalhadores sem terra ou indígenas em situação de conflito agrário.7. Outro grande problema são as mortes nas prisões. Em Pernambuco, 61 mortes em prisões foram relatadas nos primeiros 10 meses de 2007. Por todo Brasil, assassinatos nas prisões incluem (a) presos matando presos; (b) agentes de segurança matando presos; e (c) presos matando agentes. Esta questão é discutida abaixo.8. A policia no Brasil opera claramente correndo grande risco de vida na maior parte das situações. O número de policiais mortos é totalmente inaceitável e todas as medidas legais apropriadas precisam ser adotadas para prevenir tais mortes. Há, contudo, uma necessidade de observar estes números com cuidado. Em 2006, no Rio de Janeiro, 146 policias foram mortos, mas apenas 29 deles foram mortos em serviço. Uma grande proporção daqueles 117 mortos fora de serviço, provavelmente estava envolvida em atividades ilegais quando assassinados.9. Um outro grande problema que se coloca são os assassinatos perpetrados pela polícia. Essas mortes podem ser separadas em duas categorias: (a) execuções extrajudiciais cometidas por policias em serviço; (b) execuções extrajudiciais cometidas por policias fora de serviço. Cada uma destas categorias é discutida em detalhes abaixo.A. EXECUÇÕES EXTRAJUDICIAIS COMETIDAS EM SERVIÇO10. Na maioria dos casos, assassinatos cometidos por policiais em serviço são registrados como “atos de resistência” ou casos de “resistência seguida de morte”. Em 2007, no Rio de Janeiro, a polícia registrou 1.330 mortes por atos de resistência. Isto corresponde a 18 % do total de assassinatos no Rio de Janeiro. Em tese, essas são casos em que a policia teve de usar a força necessária e proporcional à resistência daquele que os agentes da lei desconfiavam ser criminosos. Na prática, o quadro é radicalmente diferente. É o próprio policial quem primeiramente define se ocorreu uma execução extrajudicial ou uma morte legal. Apenas raramente, essas auto-classificações são investigadas com seriedade pela polícia civil. Recebi muitas alegações altamente críveis de que as mortes especificadas como “resistência” eram, de fato, execuções extra-judiciais. Essas alegações são reforçadas pelo estudo de autópsias e pelo fato de que a proporção entre civis e policiais mortos é inacreditavelmente alta.11. Este e outros problemas são bem ilustrados pela operação de larga escala realizadas no Complexo do Alemão, no Rio de Janeiro, em 27 de junho de 2007, que resultou na morte de 19 pessoas. Os responsáveis pela direção da operação e pela investigação das mortes não me forneceram nenhuma evidência de que qualquer investigação substancial tenha sido realizada. Por outro lado, alegaram que quase todos os mortos tinham ficha criminal. Este fato não podia ser de conhecimento dos policiais quando mataram aquelas pessoas, e foram firmemente negados nos depoimentos feitos pelas famílias das vítimas, incluindo aquela de um garoto de 14 anos. Ainda que cada vítima tivesse um ficha criminal, a resposta apropriada era a prisão e não a execução.12. Perguntei ao chefe da Polícia Civil Rio de Janeiro sobre as revelações de uma autópsia independente que sugeria incisivamente que algumas daquelas pessoas haviam sido executadas extra-judicialmente pela policia. Ele não foi capaz de dar uma resposta cientificamente crível em relação a autópsia.13. Como assinalado acima, muitos oficiais do estado no Rio de Janeiro consideraram a operação no Complexo do Alemão um modelo para ações futuras. O resultados da operação são, de fato, dignos de nota. Os mais importantes traficantes de drogas não foram presos ou mortos, e poucas armas e drogas foram apreendidas. Nenhum policial foi morto e poucos foram feridos, mas parece que a resistência encontrada causou a morte de 19 pessoas.14. Até que ponto a operação no Complexo do Alemão reflete a principal estratégia do governo do estado, politicamente motivada e respondendo às pesquisas de opinião. Essa política é popular entre aqueles que querem resultados rápidos e demonstração de força. A ironia, é que ela é contraproducente. Muitos oficiais de policia graduados, com quem falei, foram altamente críticos à “abordagem de guerra”. As forças da polícia militar envolvidas tiveram pouco treinamento no uso de armas não letais, não houve tentativa de desenvolver policiamento comunitário nesta área, e quase nenhum serviço assistência social são oferecidos pelo estado paras as pessoas da comunidade afetada.B. EXECUÇÕES EXTRA-JUCUIAIS COMETIDAS POR POLICIAIS FORA DE SERVIÇO15. A polícia do estado, em especial a polícia militar do estado, freqüentemente tem um segundo trabalho quando fora de serviço. Alguns formam esquadrões da morte ou milícias que se envolvem na violência, incluindo execuções extrajudiciais que ocorrem por muitas razões. Primeiro, sua desonesta proteção, em que comerciantes e outros são coagidos a dar dinheiro ao grupo, são reforçadas violentamente. Segundo, para impedir que outros grupos minem o seu controle, pessoas suspeitas de colaborar com o crime organizado são mortas. Terceiro: embora esses grupos geralmente não comecem como esquadrões da morte, a relacionamento ilícito que eles desenvolvem com as pessoas mais poderosas da comunidade, freqüentemente resultam no envolvimento em assassinatos por encomenda. C. VIOLÊNCIA NA PRISÃO16. A freqüência de rebeliões e mortes nas prisões é resultado de uma série de fatores. A superlotação nas prisões contribui para a agitação dos internos e para a incapacidade dos guardas em efetivamente prevenir que armas e aparelhos de telefone celular sejam trazidos para dentro das prisões. Baixo nível educação e as poucas oportunidades de trabalho também contribuem para as agitações, assim como as falhas em assegurar ao preso sua transferência do regime fechado para o regime aberto quando possuem condições de receber esse direito. Atrasos no processo de transferência combinados à violência dos agentes e as precárias condições, encorajam o crescimento de grupos criminosos na prisão, o que pode justificar sua existência para a massa da população carcerária ao alegar agirem em nome dos presos para obter benefícios e prevenir a violência.17. Há vários órgãos com poder de investigar as condições nas prisões, mas nenhum delas o faz adequadamente. A falta de uma supervisão externa permite que as condições precárias e os abusos continuem. Em alguns lugares os presos são obrigados a aderir a uma das facções criminosas facilitando o crescimento da identificação com os grupos e das atividades a ele relacionadas. Ao mesmo tempo em que o engajamento com uma das facções do sistema prisional sejam inevitáveis no curto prazo, essa situação contribui para o crescimento das facções e eleva as taxas de criminalidade de uma forma mais geral.D. RESPOSTA DO SISTEMA DE JUSTIÇA CRIMINAL PARA EXECUÇÕES EXTRA-JUDICIAIS18. É necessária uma reforma para enfrentar o problema das execuções extra-judiciais cometidas pela polícia e mudar as estratégias e culturas dos policiais. Outra abordagem igualmente importante é assegurar que, quando uma execução extra-judicial ocorrer, os policiais envolvidos sejam condenados e presos, as vítimas obtenham justiça e o culpado não possa matar novamente. É por isso inquietante que tão poucos homicídios resultem em condenações. Uma condenação bem sucedida para o assassino é o resultado final de um processo manejado por diversas instituições: a Polícia Civil, a Polícia Técnica Científica, o Ministério Público e o poder judiciário. Se qualquer dessas instituições falha, o processo todo falha. A má notícia é que uma ou mais dessas instituições geralmente falha.19. A boa notícia é que todas essas instituições contam com um número significativo de pessoas competentes e que algumas das instituições geralmente funcionam bastante bem. Por exemplo, fiquei especialmente impressionado com o profissionalismo e a dedicação do Ministério Público. Similarmente, ainda que os programas de proteção à testemunha sofram tanto com cortes de recursos e problemas institucionais, eles conseguem, efetivamente, proteger um grande número de testemunhas.20. No meu relatório final, farei diversas recomendações específicas a respeito de como o sistema de justiça criminal deve ser reformado. Como uma observação preliminar no entanto, eu diria que, ainda que o sistema de justiça criminal esteja precisando desesperadamente de uma reforma em larga escala, tal reforma é completamente exeqüível. A sociedade brasileira deve ter compreensão da grande urgência de fazer essas reformas, mas também deveria se sentir confiante que se isso for feito com urgência, ela será bem sucedida.III. CONCLUSÕES PRELIMINARES E RECOMENDAÇÕES21. Meu relatório irá incluir recomendações detalhadas para os governos federal e estadual para reformarem as abordagens policiais e o funcionamento do sistema judiciário. Esses apontamentos preliminares põem em evidência algumas das principais recomendações:(a) Salários da polícia. Baixos salários para os policiais levam à falta de orgulho profissional e encorajam o envolvimento em corrupção, à adesão a um segundo trabalho e à formação de esquadrão da morte e outros grupos para complementar o salário. As reformas devem incluir salários mais altos;(b) Investigação das mortes cometidas por policiais. A Polícia Civil e os serviços internos da polícia devem efetivamente investigar as mortes causadas pelos policiais. Em muitos estados, o sistema corrente de classificar imediatamente as mortes causadas pela polícia como “ato de resistência” ou “atos de resistência seguida de morte” é completamente inaceitável. Cada morte é um assassinato em potencial e deve ser investigado como tal;(c) Forense. A Polícia e instituições forenses devem ter melhores recursos e prover maior independência;(d) Proteção à testemunha. Testemunhas de execuções extrajudiciais cometidas por policiais e pelo crime organizado temem legitimamente represálias ao testemunhar. Este medo cresce quando o policial permanece em serviço durante as investigações. Há muito de impressionante sobre os atuais programas de proteção à testemunha, mas suas inadequações devem também ser francamente reconhecidas e urgentemente enfrentadas.(e) Ouvidoria. Nos estados que visitei, a ouvidoria de policia falha em sua verdadeira independência ou na habilidade de juntar provas por si própria. Isso deve ser mudado: a polícia requer uma genuína supervisão externa, tanto quanto interna.(f) Procuradores públicos: O Ministério Público é um órgão dedicado e profissional. Ele deve ter um papel chave para iniciar a investigação de cada incidente envolvendo morte causada pela polícia.(g) Monitoramento das prisões: As muitas instituições destinadas à monitora as condições da prisão, mais destacadamente, juizes de execução penal, são incapazes ou falham em exercer esta função de forma adequada. O número destes juízes deve ser aumentado, e a forma como trabalham deve ser substancialmente melhorada.(h) Administração das prisões: As prisões devem ser administradas pelos guardas e não pelos presos. No Rio de Janeiro, a prática de forçar novos presos, que nunca pertenceram a nenhuma facção a entrar no sistema é cruel e causo aumento destes grupos.22. O povo brasileiro não lutou bravamente contra 20 anos de ditadura e nem adotou uma Constituição dedicada a restaurar o respeito aos direitos humanos unicamente para fazer o Brasil livre para que policiais matem impunemente em nome da segurança. É imperativo que os Governos Federal e estadual sustentem reformas nas direções que indiquei para fortalecer a segurança dos cidadãos comuns e promover o respeito aos direitos humano.
Postado por Pedro Porfirio no blog http://www.porfiriolivre.info/ em 26/11/10

quinta-feira, 25 de novembro de 2010

As 10 estratégias de manipulação midiática, por Noam Chomsky

24/11/2010 17:42, Por Noam Chomsky - de Boston, EUA
1. A estratégia da distração. O elemento primordial do controle social é a estratégia da distração, que consiste em desviar a atenção do público dos problemas importantes e das mudanças decididas pelas elites políticas e econômicas, mediante a técnica do dilúvio ou inundação de contínuas distrações e de informações insignificantes. A estratégia da distração é igualmente indispensável para impedir que o público se interesse pelos conhecimentos essenciais, na área da ciência, da economia, da psicologia, da neurobiologia e da cibernética. “Manter a atenção do público distraída, longe dos verdadeiros problemas sociais, cativada por temas sem importância real. Manter o público ocupado, ocupado, ocupado; sem nenhum tempo para pensar; de volta à granja com outros animais (citação do texto “Armas silenciosas para guerras tranquilas”).
2. Criar problemas e depois oferecer soluções. Esse método também é denominado “problema-ração-solução”. Cria-se um problema, uma “situação” previsa para causar certa reação no público a fim de que este seja o mandante das medidas que desejam sejam aceitas. Por exemplo: deixar que se desenvolva ou intensifique a violência urbana, ou organizar atentados sangrentos, a fim de que o público seja o demandante de leis de segurança e políticas em prejuízo da liberdade. Ou também: criar uma crise econômica para forçar a aceitação, como um mal menor, do retrocesso dos direitos sociais e o desmantelamento dos serviços púbicos.
3. A estratégia da gradualidade. Para fazer com que uma medida inaceitável passe a ser aceita basta aplicá-la gradualmente, a conta-gotas, por anos consecutivos. Dessa maneira, condições socioeconômicas radicalmente novas (neoliberalismo) foram impostas durante as décadas de 1980 e 1990. Estado mínimo, privatizações, precariedade, flexibilidade, desemprego em massa, salários que já não asseguram ingressos decentes, tantas mudanças que teriam provocado uma revolução se tivessem sido aplicadas de uma só vez.
4. A estratégia de diferir. Outra maneira de forçar a aceitação de uma decisão impopular é a de apresentá-la como “dolorosa e desnecessária”, obtendo a aceitação pública, no momento, para uma aplicação futura. É mais fácil aceitar um sacrifício futuro do que um sacrificio imediato. Primeiro, porque o esforço não é empregado imediatamente. Logo, porque o público, a massa tem sempre a tendência a esperar ingenuamente que “tudo irá melhorar amanhã” e que o sacrifício exigido poderá ser evitado. Isso dá mais tempo ao público para acostumar-se à ideia de mudança e de aceitá-la com resignação quando chegue o momento.
5. Dirigir-se ao público como se fossem menores de idade. A maior parte da publicidade dirigida ao grande público utiliza discursos, argumentos, personagens e entonação particularmente infantis, muitas vezes próximos à debilidade mental, como se o espectador fosse uma pessoa menor de idade ou portador de distúrbios mentais. Quanto mais tentem enganar o espectador, mais tendem a adotar um tom infantilizante. Por quê? “Ae alguém se dirige a uma pessoa como se ela tivesse 12 anos ou menos, em razão da sugestionabilidade, então, provavelmente, ela terá uma resposta ou ração também desprovida de um sentido crítico (ver “Armas silenciosas para guerras tranquilas”)”.
6. Utilizar o aspecto emocional mais do que a reflexão. Fazer uso do aspecto emocional é uma técnica clássica para causar um curto circuito na análise racional e, finalmente, ao sentido crítico dos indivíduos. Por outro lado, a utilização do registro emocional permite abrir a porta de aceeso ao inconsciente para implantar ou enxertar ideias, desejos, medos e temores, compulsões ou induzir comportamentos…
7. Manter o público na ignorância e na mediocridade. Fazer com que o público seja incapaz de compreender as tecnologias e os métodos utilizados para seu controle e sua escravidão. “A qualidade da educação dada às classes sociais menos favorecidas deve ser a mais pobre e medíocre possível, de forma que a distância da ignorância que planeja entre as classes menos favorecidas e as classes mais favorecidas seja e permaneça impossível de alcançar (ver “Armas silenciosas para guerras tranquilas”).
8. Estimular o público a ser complacente com a mediocridade. Levar o público a crer que é moda o fato de ser estúpido, vulgar e inculto.
9. Reforçar a autoculpabilidade. Fazer as pessoas acreditarem que são culpadas por sua própria desgraça, devido à pouca inteligência, por falta de capacidade ou de esforços. Assim, em vez de rebelar-se contra o sistema econômico, o indivíduo se autodesvalida e se culpa, o que gera um estado depressivo, cujo um dos efeitos é a inibição de sua ação. E sem ação, não há revolução!
10. Conhecer os indivíduos melhor do que eles mesmos se conhecem. No transcurso dos últimos 50 anos, os avanços acelerados da ciência gerou uma brecha crescente entre os conhecimentos do público e os possuídos e utilizados pelas elites dominantes. Graças à biologia, à neurobiologia e à psicologia aplicada, o “sistema” tem disfrutado de um conhecimento e avançado do ser humano, tanto no aspecto físico quanto no psicológico. O sistema conseguiu conhecer melhor o indivíduo comum do que ele a si mesmo. Isso significa que, na maioria dos casos, o sistema exerce um controle maior e um grande poder sobre os indivíduos, maior do que o dos indivíduos sobre si mesmos.
Noam Chomsky é linguista, filósofo e ativista político estadunidense. Professor de Linguística no Instituto de Tecnologia de Massachusetts

-extraído do site Correio do Brasil (http://correiodobrasil.com.br/as-10-estrategias-de-manipulacao-midiatica/192708/) em 25.11.10

sábado, 13 de novembro de 2010

Urgência Permanente, por Mateus Alves da Silva

13/11/10

Slavoj Zizek, filósofo sloveno nascido em 1949, autor de “Bem Vindo ao Deserto do Real”, Boitempo, 2003, em artigo publicado no “Le Monde Diplomatique Brasil”, edição de novembro/10, analisa o que ele chama de duas ficções surgidas com os protestos europeus contra a política de austeridade que implementa corte de benefícios em alguns países daquele continente, notadamente na França e na Grécia e em menor escala na Itália, Irlanda e Espanha. A despolitização das decisões tomadas para se enfrentar a crise, apresentadas como “resposta técnica aos imperativos financeiros”, patrocinada pelo poder e pela mídia. E a sustentação de que a política de austeridade é apenas mais um meio de extinção do estado de bem-estar social pelo capital feita pelos que protestam.
Como indicativo da primeira, Slavoj alega que, por exemplo, não se aponta a ajuda aos bancos como a causa do déficit atual nas contas públicas, como no caso da que a União Européia deu à Grécia, exclusivamente, para pagamento de bancos franceses e alemães.
Aponta, também, a falta de programa da “esquerda contemporânea”, que a faz limitar sua utopia ao convencimento de que é capaz de se a adaptar àquele modelo de estado e a lutar somente pela manutenção de suas conquistas ameaçadas, abandonando a pretensão de mudá-lo e assimilando a necessidade dos sacrificantes cortes sociais como irrefutável.
Diz que se vive no “estado de urgência econômica permanente”, sem a promessa de que os benefícios serão restabelecidos, sendo que esta uma “nova era” de prometida austeridade severa e drástica economia em saúde, aposentadoria e educação, com a precariedade do trabalho, coloca a esquerda a defender aquelas conquistas e a renunciar ao desafio de explicar a natureza política da crise e da definição do modelo de sistema.
Slavoj coloca em cheque a capacidade de manutenção das conquistas no capitalismo, e salienta que, apesar de a esquerda contemporânea manter-se consciente de que esse sistema assenta-se sobre postulados pseudo-naturais, cuja quebra dizem que conduziria ao desastre econômico, os protestos não ultrapassam a busca de soluções circunstanciais para atenuar os efeitos da crise.
Critica a crítica ao capitalismo que não discute o cenário liberal democrático no qual aquele faz sua pilhagem nem contesta os “mecanismos institucionais do estado de direito burguês e evoca a atualidade da análise marxista, para a qual, em primeiro plano, a questão da liberdade não se situa na esfera política institucional, mas na das relações sociais do modo de produção, “do trabalho à família”. Lembra que nunca se pergunta ao eleitor, por exemplo, sobre quem deve possuir o quê, sobre a forma de gerenciamento do seu trabalho etc, e afirma que a política institucional jamais concederá a extensão da democracia a setores fora de seu domínio, como no caso de se criar bancos democráticos controlados pelos cidadãos. Destaca, nesse sentido, que as pequenas conquistas obtidas nos processos democráticos funcionam apenas como parte da engrenagem do estado burguês de reprodução do capital.
Slavoj aborda, ainda, a ineficiência do dogma liberal da necessidade da violência ilegítima (cortes de direitos) e salienta o da legitimidade da violência dos oprimidos, desnecessária, porém, e utilizável apenas como decisão estratégia. Frisa que se atacam apenas as medidas cuidadosamente estudadas e implementadas pelos “poderes públicos e pelas instituições financeiras“, segundo seus critérios e interesses próprios.
Sugere, em seguida, que a falta de proposta de uma contraofensiva, necessária e à altura, com os “conseqüentes” cenários catastróficos e violentos, se deve ao fato de os intelectuais radicais não estarem dispostos a suportar os transtornos em seu conforto e carreiras, tocadas dentro de uma existência segura e protegida, dizendo que muito preferem ver a revolução acontecer em países distantes, como Cuba, Nicarágua ou Venezuela.
Arremata dizendo que essa mesma intelectualidade está necessariamente diante de uma verdadeira mudança, gerada pelo desmantelamento do estado de bem estar-social das avançadas economias industriais, sendo que, apesar de ter que perseverar no trabalho intelectual paciente e sem resultado prático imediato, ela não está dispensada de refletir sobre a forma como aparecem as questões a serem solucionadas, ou seja, de assumir o papel do pensamento.
Slavoj salienta, anda, a imposição da economia como ideologia hegemônica, com a lógica do mercado e da concorrência. Como diz, a escola, espremida pela lógica da “maior eficiência com o menor custo”, assumiu o papel na educação de representar cada vez menos “um serviço público independente do mercado”, mantido pelo poder público como guardião de valores esclarecidos, como os da liberdade, igualdade e fraternidade, sendo invadida cada vez mais pelas diversas formas de parcerias público-privadas. Como lhe parece, mesmo o sistema político assume cada vez mais o modelo de empresa, com as eleições concebidas como certa “transação comercial”, na qual o eleitor compra o produto mais indicado para a preservação da ordem social, punição de criminosos etc.
Conclui destacando a feição comercial assumida por várias aspectos do estado, como a terceirização da administração da segurança, o mercenarismo do serviço militar e a própria perda do caráter universal hegeliano da burocracia estatal, e sustenta que as leis do mercado invadiram até mesmo as relações amorosas, onde compra-se o objeto amado como mercadoria, com direito a todas as maquiagens, via internet.
Acentua o distanciamento do sonho da transformação social diante de todos esses fatores, mas aponta que é exatamente essa impossibilidade aparente que nos leva a refletir sobre a estranha organização da fronteira entre o possível e o impossível, sendo que, no campo do lazer e das tecnlogias, somos bombardeados com a idéia de que “nada é impossível”, das experiências sexuais aos acessos a dados, incluindo-se a possibilidade da vida eterna com nossa transformação em softwares. Ao passo que no campo socioeconômico, crê-se na humanidade acabada, plenamente madura, renunciante às utopias milenares, com a aceitação das contingências da realidade “capitalista” e de todos os seus “impossíveis”. A impossibilidade de se engajar em causas coletivas sem se transformar no terror, de se usufruir do bem-estar social sem perder a competitividade e causar a crise, de viver fora do mercado mundial sem se transformar na Coréia do Norte.
Denuncia, enfim, o esforço da ideologia dominante para nos convencer da impossibilidade da transformação radical, do fim do capitalismo e da criação de uma democracia não reduzida a um jogo parlamentar corrupto, tornando invisível o antagonismo que atravessa o sistema.
Slovaj chama a atenção para a possibilidade da chegada de Morales, Chaves ou do governo maoísta do Nepal ao poder, pela via democrática, e indaga se esses governantes, exatamente por estarem na contramão da história e sem nenhum apoio “objetivo”, nada mais podendo fazer que improvisar, não estariam, de fato, numa situação de liberdade excepcional, na qual, aliás, estaria toda a esquerda, exatamente por não saber o que fazer, ao contrário do que ocorria no início do séc. XX, quando apenas tinha que esperar o momento certo, mas precisando agir imediatamente, sob pena de sua inércia produzir, em breve, situação ainda mais desastrosa. Ou seja, uma situação na qual ela pode estar diante da possibilidade de o impossível acontecer.

quarta-feira, 10 de novembro de 2010

Elites jurídicas controlam sistema Judicial

Em estudo concluído em setembro sobre o sistema jurídico brasileiro, o cientista político Frederico Normanha Ribeiro de Almeida verifica a existência de uma política entre grupos de juristas influentes dentro do sistema jurídico nacional, no sentido de formar alianças e disputar espaço, cargos e poder dentro da administração do sistema. Segundo Almeida, este é um estudo inovador, pois constata um jogo político “difícil entender em uma área em que as pessoas não são eleitas e, sim, sobem na carreira, a princípio, por mérito”.
Em sua tese de doutorado A nobreza togada: as elites jurídicas e a política da Justiça no Brasil, orientada pela professora Maria Tereza Aina Sadek da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP, o pesquisador identificou, por meio de entrevistas, análises de currículos e biografias e uma análise documental da Reforma do Judiciário, três tipos de elites políticas dentro do sistema Judicial brasileiro: elites institucionais, profissionais e intelectuais.
Segundo ele, as elites institucionais são compostas por juristas que ocupam cargos chave das instituições da administração da justiça estatal, como o Supremo Tribunal Federal (STF), Superior Tribunal de Justiça, Tribunais Estaduais, Ministério Público, Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e Conselho Nacional de Justiça( CNJ).
Já as elites profissionais são caracterizadas por lideranças corporativas dos grupos de profissionais do Direito atuantes na administração da justiça estatal, como a Associação dos Magistrados Brasileiros, OAB e a Confederação Nacional do Ministério Público.
O último grupo, as elites intelectuais são formadas por especialistas em temas relacionados à administração da justiça estatal. Este grupo, apesar de não possuir uma posição formal de poder, possui influência nas discussões sobre a área e em reformas políticas, como no caso dos especialistas em direito público e em direito processual.
No estudo verificou-se que as três elites políticas identificadas possuíam em comum a origem social, as Universidades e as trajetórias profissionais.
– Todos os juristas que formam esses três grupos provém da elite ou da classe média em ascensão e de Faculdades de Direito tradicionais, como o Faculdade de Direito (FD) da USP, a Universidade Federal de Pernambuco e, em segundo plano, as Pontifícias Universidades Católicas (PUC’s) e as Universidades Federais e Estaduais da década de 60.
Em relação às trajetórias profissionais dos juristas que ocupam essa elite, Almeida aponta que a grande maioria desses profissionais já exerceram advocacia, o que revela que “a passagem pela advocacia tende a ser mais relevante do que a magistratura”. Exemplo disso, é que a maior parte dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), que são indicados pelo Presidente da República, serem ou terem exercido advocacia em algum momento de sua carreira.”
O cientista político também aponta que apesar de a carreira de um jurista ser definida com base no mérito, ou seja, via concursos, há um série de elementos que influenciam os resultados desta forma de avaliação. Segundo ele, critérios de avaliação como porte e oratória, favorecem indivíduos provenientes da classe média e da elite sócio-econômica, enquanto a militância estudantil e a presença em nichos de poder são fatores diretamente ligados às relações construídas nas faculdades.
– No caso dos Tribunais Superiores, não há concursos, são exigidos como requisito de seleção ‘notório saber jurídico’, o que, em outras palavras, significa ter cursado as mesmas faculdades tradicionais que as atuais elites políticas do Judiciário cursaram –, afirma o pesquisador.
Por fim, outro fator relevante notado nos levantamentos do estudo foi o que Almeida denominou de “dinastias jurídicas”. Ou seja, famílias que estão presentes por várias gerações no cenário jurídico.
– Notamos que o peso do sobrenome de famílias de juristas é outro fator que conta na escolha de um cargo-chave do STJ, por exemplo. Fatores como estes demonstram a existência de uma disputa política pelo controle da administração do sistema Judiciário brasileiro –, conlcui Almeida.

9/11/2010 12:23, Redação, com Agência USP - de São Paulo

-extraído do site correio do brasil (http://correiodobrasil.com.br)em 10/11/09

terça-feira, 9 de novembro de 2010

Polícia gaúcha caça grupo neonazista em atividade no Sul

7/11/2010 16:23, Por Redação, de Porto Alegre

Grupos neonazistas se proliferam em sociedades dominadas pelas forças da direita
A Polícia Civil gaúcha intensificou o combate a um grupo neonazista em Porto Alegre (RS) que divulgou um vídeo com trechos de reportagens sobre a política de quotas nas universidades, cenas de violência entre agressores negros e vítimas brancas, a imagem do senador Paulo Paim (PT-RS) e da ex-ministra da Igualdade Racial Matilde Ribeiro. O material, que inclui ainda CD’s, DVD’s, fotografias, camisetas, distintivos, facas, correntes, uma soqueira e um computador portátil, foi recolhido em uma residência, sexta-feira, no Centro de Porto Alegre.
O responsável pelos objetos não foi localizado. Ele é membro do White Power Sul Skin, um dos grupos neonazistas atuantes no Sul do país que pregam a limpeza racial e a doutrina de que negros, homossexuais e judeus são inferiores.
– Isso não nos intimida. Se pensavam que iam me prejudicar no processo eleitoral, se deram mal. Pretendo fazer uma audiência pública no Congresso, chamar a CNBB, a OAB, o Ministério da Justiça, porque isso é uma situação nacional. É inadmissível, enquanto os EUA elegem um presidente negro, a Bolívia, um índio, e o Brasil, um operário e, agora, uma mulher – afirmou Paim.
Neste domingo, o senador Paulo Paim (PT-RS) divulgou uma nota na qual repudia os atos de um grupo neonazista. Na nota, Paim, que foi reeleito para um mandato de oito anos no Senado, afirma que as ameaças não o intimidarão e que sua luta para o fim de todos os preconceitos prosseguirá. O parlamentar propôs a realização de uma audiência pública para debater o tema, no dia 19 deste mês, véspera do Dia Nacional da Consciência Negra.
Leia a íntegra da nota
“Se eles pensam que com este movimento vão calar a minha voz no Congresso Nacional, que sempre foi e será, em defesa dos discriminados, sejam eles negros, brancos, índios, ciganos, evangélicos, católicos, de matriz africana, judeus, palestinos e daqueles que lutam pela livre orientação sexual, estão enganados. Pelo contrário. Continuarei a minha luta para que todos os preconceitos e discriminações sejam eliminados em nosso país. Se o material elaborado por essas pessoas foi feito para me intimidar ou prejudicar, isso não aconteceu, pois não me intimido e tampouco os gaúchos. Lembro que há oito anos fui eleito para o Senado com 2 milhões de votos e o povo gaúcho numa demonstração de repúdio a esse tipo de atitude neonazista me reelegeu com quase o dobro de votos, 3.9 milhões. Sou o único senador negro eleito e reeleito na história da República Brasileira. Sei das minhas responsabilidades perante este momento. É inadmissível que em pleno século 21, quando os Estados Unidos elegeram um negro presidente, a Bolívia um índio presidente e o Brasil uma mulher presidente, nós tenhamos que conviver com situações como a ocorrida hoje em Porto Alegre. Tenho absoluta certeza que atitudes como essa não são aceitas pelo povo gaúcho e brasileiro. Não vou exigir segurança pessoal como foi levantado. Pretendo sim, realizar uma audiência pública aqui no Senado no dia 19 de novembro, véspera do Dia Nacional da Consciência Negra com a presença da OAB, CNBB, Ministério da Justiça, Direitos Humanos, Movimento Negro.
Senador Paulo Paim”

extraído do site correiodobrasil.com.br, em 09/11/10

terça-feira, 2 de novembro de 2010

"Temos que casar cultura e educação", entrevista de Antonio Grassi dada ao blog do José Dirceu

Publicado em 23-Set-2010
"Temos que casar cultura e educação"

O alerta é do ator, produtor e diretor teatral, Antonio Grassi.



A conclusão é de Antonio Grassi, mineiro e nacionalmente conhecido por seu trabalho como ator na teledramaturgia, cinema e teatro - a este levado pela militância estudante. Desde então, afirma Grassi, arte e política caminham juntas em sua trajetória.

Além de ator, produtor e diretor teatral, Grassi foi secretário estadual de Cultura do Rio e presidente da FUNARTE. Com sua experiência na área pública, ele explica a importância de conciliarmos cultura e educação. O ator elenca também as conquistas do governo Lula para o setor e os desafios que ainda se apresentam.

Nesta entrevista, Grassi, também, conta os caminhos que o levaram ao teatro e, posteriormente, à teledramaturgia. Recém nomeado para a gerência executiva regional da TV Brasil (RJ), o ator fala ainda sobre a importância da emissora pública e dá o recado: "a TV não é do Lula, mas do Brasil".



[ Zé Dirceu ] Como você, militante e participante de vários momentos importantes do PT, avalia a área cultural sob o governo Lula? Tivemos avanços nos últimos oito anos?

[ Grassi ] É inegável que tivemos e muitos. Antes, a área da cultura estava entregue ao Deus dará, ou melhor, ao mercado que regia a produção e a política pública no setor. Então, tivemos um avanço importante. Agora, é bom que se diga, nós construímos a história e as nossas expectativas eram maiores em relação a algumas coisas.

De uma forma geral, o governo Lula entrou com muita expectativa e uma perspectiva importante sobre alguns temas que estavam no ponto para serem trazidos ao debate. Neste sentido, talvez tenhamos trabalhado mal, porque perdemos oportunidades importantes e o time de debatê-las. E isso se deu nao apenas pela forma como inserirmos algumas discussões no país.

Cito os exemplos dos debates sobre a Ancinav, a reforma da Lei Rouanet e também sobre políticas mais estruturais do Ministério da Cultura (MinC). O caso da Ancinav é exemplar. Durante o período da transição do governo FHC para o de Lula (fim de 2002) e durante a campanha, havia um consenso frente ao programa de governo e às discussões que fizemos sobre o audiovisual. Após a posse, ao trazer sobre esse tema, ele foi satanizado e, surpreendentemente, pelos mesmos que davam sua aprovação anteriormente. Obviamente, a disputa política coloca elementos que mudam a posição de algumas pessoas, mas nesses casos, nós perdemos o time.

Formação de platéia
é um desafio

[ Zé Dirceu ] Com sua experiência na gestão de políticas culturais, quais os principais desafios que precisamos enfrentar nos próximos anos?

[ Grassi ] Um dos principais é como inserir a cultura no importante pilar das políticas públicas. Como casar de novo a cultura com a educação. Na prática, elas estão desquitadas administrativamente e em termos de ação política. Qualquer coisa que se discuta hoje em relação à cultura - tanto em termos de mercado, de preservação de memória etc - o que vemos é o completo desquite com a área de educação.

Hoje no sistema educacional temos uma grande leva de professores sem acesso ao cinema, teatro, museus, galerias de arte e concertos, por exemplo. E se não temos isso com os professores, não dá para imaginar que tenhamos com os alunos. A formação de platéia é o grande desafio que temos pela frente.

Você entra em um museu em Paris, no Orsay, por exemplo, e encontra turmas imensas de alunos com seus professores discutindo Van Gogh. Esse é portanto um trabalho que temos que fazer no Brasil com urgência. Integrar a cultura e a educação.

Não dá para falar de
produção sem exibição

[ Zé Dirceu ] Em relação ao cinema brasileiro, que teve um crescimento de qualidade, com novas películas, novos artistas, novos cinemas. O que é necessário não só para estimular a produção, mas levar o brasileiro a ver filme nacional e criar essa platéia a que você se refere? As políticas novas do governo de patrocínio e incentivo pelas estatais são corretas na sua avaliação?

[ Grassi ] A meu ver é uma política que carece de um ponto central: não dá para você falar da produção sem falar do desdobramento disso, ou seja, não dá para falar de produção sem exibição. Criamos um ambiente complicado, onde existem produtores culturais que têm acesso à Lei do Audiviosual, através de incentivos, por exemplo, mas que produzem seus filmes e não exibem, embora se habilitem para produzir os próximos. Então, o critério da produção passa a não fazer parte do contexto.

Sempre que você vai ao Festival de Cinema em Brasília, há um filme inovador. No ano seguinte, aquele mesmo cineasta estará lá, mas sem que o filme inovador do ano passado tenha sido visto. E o mais lamentável, alguns nem chegam ao Festival. Este é um ponto que precisa ser atacado com firmeza. Não podemos desvincular a produção da exibição.

No caso do teatro, por exemplo, a coisa é muito mais séria. Tínhamos sessões habitualmente de terça a domingo, com vesperais no sábado, domingo e na quinta-feira. Hoje, não temos mais isso. Temos teatro de sexta a domingo e só. Isso tem a ver com a questão da educação. Nós temos um público no Brasil - não vou falar nem dos alunos das escolas, mas de professores - que precisa ser chamado. Se professores fossem ao cinema e ao teatro, nós já teríamos um público vinte vezes maior do que esse que temos.

Filmes de arte
viraram cinemateca

[ Zé Dirceu ] E quanto à questão do mercado externo?

[ Grassi ] Temos que criar mecanismos de distribuição distintos daqueles que usam estas distribuidoras. Isso é difícil. Você vai competir no mercado com um filme do qual chegam duzentas cópias e com cinemas rateando para conseguir 1 milhão de espectadores

[ Zé Dirceu ] Neste caso, os investimentos não são necessários só para a produção, mas para a exibição. E não há só complexos de cinemas de shooping, existem os bairros. Com a demanda crescendo, melhorando a renda da população será possível um investimento para a produção e para a exibição. Da mesma maneira que existem hotéis 5, 4, 3 estrelas, nós poderíamos ter cinemas com 30 lugares, um espaço honesto, simples, limpo, onde ao invés de pagar R$ 25,00 reais, você pudesse pagar R$ 5,00.

[ Grassi ] Sim, claro. Inclusive, em uma de nossas discussões, falamos sobre a interferência da sala no tipo de cinema que você vai ver. A sala te obriga a assistir a determinado filme. Esses grandes complexos cinematográficos, por exemplo, que associam o filme à pipoca, àquilo que você compra na entrada, condicionam o público a ver um tipo de filme que está lá dentro. Dificilmente você vai encontrar nestas salas, um filme como aqueles que gostávamos de ver antigamente, aqueles europeus. Um filme mais de arte não têm espaço nesses lugares. É como se fosse incompatíveis.

[ Zé Dirceu ] Viraram filmes de cinemateca?

[ Grassi ] Viraram cinemateca mesmo.

Há um estrangulamento
na teledramaturgia

[ Zé Dirceu ] Como você avalia a TV brasileira e, em especial, a teledramaturgia?

[ Grassi ] A teledramaturgia é um grande artigo de exportação. Adquiriu qualidades inegáveis de produção, de equipamento técnico e a contribuição da Rede Globo neste sentido é muito grande. Mas, chegamos a um modelo que está em seu ponto de esgotamento. Há um estrangulamento por conta até do próprio excesso de produção. E isso se pensarmos que todas as emissoras concorrentes da Globo colocam como mote para a concorrência a teledramaturgia sob o mesmo formato de novelas, capítulos e tal... Se elas não tiverem eixo padronizado, perigam fracassar. Caímos, portanto, numa situação em que é difícil uma novela que possa inovar. Então, a teledramaturgia poderá avançar, mas em outros modelos.

Por exemplo, esse modelo que hoje estamos vendo nas prateleiras das grandes redes de livraria: um box com DVD das séries americanas, House, Brothers and Sisters etc. Você tem ali uma variedade de teledramaturgia que não é de novelas. Esse é um caminho. Temos qualidade para produzir várias séries, mas neste caso, há um aspecto econômico. Quando você produz uma minissérie com 40 capítulos ou com 20, que é o formato tradicional - caso de Memorial de Maria Moura, Casa das Sete Mulheres, Os Maias, por exemplo - o custo do investimento nestes 20 capítulos é igual ao de uma novela. Cenário, direção de arte, atores têm o mesmo custo. A diferença é que na novela há 200 capítulos para você recuperar esse investimento. Na minissérie não.

Por outro lado, e aí está a questão, esse filão do DVD é um mercado que a TV brasileira ainda não se apropriou. Os americanos já o fizeram. Portanto, há um mercado que compensa a deficiência do retorno da televisão, mas isso ainda está muito capenga no Brasil.

TV pública é do Brasil

[ Zé Dirceu ] Qual a importância e o papel da EBC, a TV Brasil, hoje no país? Ela está no seu início, quais as perspectivas de futuro em termos de comunicação pública?

[ Grassi ] Desde quando trabalhávamos as questões do programa de cultura, em todas as campanhas que fizemos - e eu participei de todas - a questão da comunicação e da televisão sempre esteve presente. Antes, nós arranhávamos muito superficialmente estes temas, porque achávamos que jamais chegaríamos nele. Mas trabalhamos a perspectiva da TV pública e agora ela é uma realidade. Aliás, o termo público deveria ser melhor trabalhado, até para conseguirmos mais adesão das pessoas.

É muito complicado falar da TV pública, porque essa palavra traz a falsa ideia de morosidade, burocracia e falta de qualidade. Sem falar da questão política, aproveitada pela oposição ao governo que diz “a TV do Lula”. Isso é uma balela! A TV pública é uma conquista importantíssima de todos os brasileiros. As mesmas pessoas que falam da BBC de Londres como referência, da RAI italiana, a TVE da Espanha, desprezam a TV Brasil que como estas, também é pública e tem seu conselho curador.

A TV Brasil, portanto, é uma grande conquista e traz o desafio de fazermos uma TV pública de qualidade, que tenha uma função de complementaridade da TV comercial. Ou seja, ela deve abordar certos assuntos, com linguagens e temas que a TV comercial não faz. E, principalmente, trabalhar a diversidade nacional, a regionalização da programação. O grande trunfo da TV Brasil foi a rede pública ter aderido à rede nacional.





[ Zé Dirceu ] Todas aderiram?

[ Grassi ] Todas, menos São Paulo e Rio Grande do Sul. Mas os demais Estados sim. Inclusive, educativas e universitárias. Isso foi muito importante. Hoje a EBC trabalha num formato muito interessante. Você tem em rede 10 horas de programação, sendo 4 de programação regional. O cara em São Paulo pode ver a programação de Pernambuco. Essa é a regionalização que tanto falamos. Um avanço fantástico. Só que temos dificuldade para divulgar isso, para que percebam a importância desse momento. Além disso, nestas questões políticas, temos que lutar contra o estigma e dizer: "Não é a TV do Lula, nem do governo. É a TV do Brasil".

Movimento estudantil,
o teatro como instrumento.

[ Zé Dirceu ] Arte e política se misturam? Como você concilia seu trabalho de ator com sua luta pela arte no país?

[ Grassi ] Há uma história de vida pessoal. O que me levou ao teatro não foi a atividade artística em si. Eu comecei no colégio estadual central em Belo Horizonte, em um grupo secundarista naquela época muito importante com vários companheiros. Dilma [Rousseff] e [Fernando] Pimentel passaram por lá. Naquele momento da discussão política, do movimento estudantil mesmo, o teatro era um instrumento. Havia muito daquela história que o Plínio Marcos dizia “o teatro é uma tribuna livre onde vão se debater os problemas do homem”.

Então, víamos o teatro como essa ferramenta, mais do que a questão artística propriamente dita. Ali tivemos contato com os demais movimentos. Minha opção pelo teatro, portanto, nunca esteve desvinculada do pensamento político. E a partir daí, todas as afinidades começaram a acontecer com as pessoas que tinham essa preocupação política. Eu fiz teatro independente naquela época. Com o pessoal do Asdrúbal Trouxe o Trombone, do Cacá Rosset, do Paulo Betti. Começamos com esse teatro mais político, de cooperativa. Nós éramos os produtores do nosso trabalho. Então, para mim, arte e política sempre estiveram juntas. É difícil desvincular uma coisa da outra.

[ Zé Dirceu ] E sobre seu trabalho, quais as angústias e satisfações de ser um ator reconhecido em todo o Brasil? Para as novas gerações, existe uma formação profissional à altura da demanda requerida hoje?

[ Grassi ] Nós todos vivemos uma tragédia nesta questão da sobrevivência profissional. Eu, por exemplo, comecei a fazer teatro em Minas, depois me profissionalizei. Mas havia uma coisa naquele tempo: nós tínhamos a TV como uma área pela qual jamais nos interessaríamos. Quando comecei a fazer teatro, naquele tempo, os atores de TV eram por nós considerados “menores”. Havia atores de teatro que falavam temas relevantes e os de TV que nós considerávamos "menores". Durante muito tempo, era muito bom saber que a Fernanda Montenegro e o Paulo Autran se recusavam a fazer novelas de televisão. Mas, em determinado momento, ligamos a TV e estava lá a Fernanda jogando torta na cara do Paulo! A situação tinha mudado, era outra.

Ao entrarmos na TV, nós quebramos o preconceito que a minha geração tinha em relação a ela. Isso nos inseriu num outro mundo em que tivemos que nos adaptar. Acredito que a geração que vem agora tem uma possibilidade mais ampla de atuação, fora dessa coisa limitada “só pela telenovela”. Hoje, vemos atores com outra formação. Agora, não poderemos avançar mais nisso se não tivermos um avanço também nas outras formas de arte.

[ Zé Dirceu ] Você fala do cinema e eu percebo um renascimento, um crescimento, não só na qualidade, mas na quantidade da produção. E no teatro?

[ Grassi ] O teatro é diferente porque ele tem uma situação muito complicada. A relação dele com a Lei Rouanet é muito perversa. O teatro criou um formato que distanciou o público. Aquela relação viva do teatro de terça a domingo acabou. Hoje só de sexta a domingo, como eu disse anteriormente. E as contas que fazíamos para a manutenção do espetáculo não existem mais. Quando você manda um projeto de teatro para capta patrocínio pela Lei Rouanet, tem que computar a produção e a manutenção, porque a bilheteria não sustenta as duas.

A quantidade de 12 espetáculo que temos por mês – 3 por semana – equivale ao mesmo custo de 48 espetáculos mensais, porque os técnicos são contratados por mês, iluminação etc. Então, o que acontece? Redução da equipe técnica, produção de uma quantidade imensa de monólogos ou peças com menos atores. Raramente temos produções com muita gente em cena.

As produções dos musicais americanos são outra realidade. Elas têm um patrocínio forte e um outro tipo de apelo. Veja que os próprios teatros foram incorporando em o patrocinador a seus nomes, Teatro Alfa, Bradesco etc. Com isso perdemos mesmo a relação viva do teatro que é hoje muito difícil e delicada.

A chiadeira em relação da Lei Rouanet, no caso do teatro é dramática, porque você tira a possibilidade dos 100% de abatimento fiscal. Aí, a possibilidade concreta de não haver nenhum patrocinador é muito grande. Principalmente, porque pela lei do audiovisual há a possibilidade desse cara ter 125% de abatimento. Então, você oferece ao patrocinador sua peça, mas ele tem 125% pela Lei do Audivisual, e pelo teatro apenas 70%. O cara, obviamente, vai para a Lei do Audiovisual. Essa relação é dura.

Por isso eu vou repetir pela terceira vez o mote: se não tiver o vinculo com a educação... Só ele pode ser a salvação do teatro para que tenhamos uma formação de platéia, um público que pode gostar de ver aquilo ao vivo, sem ser gravado.

“Romeu e Julieta não se adia nunca”

[ Zé Dirceu ] E os Centros de Educação Unificada (CEUs) implantados pela prefeita do PT, Marta Suplicy em São Paulo?

[ Grassi ] O princípio dos CEUs é muito legal porque você vincula a manifestação artística à educação. Para mim, esta é a única saída, até mesmo para não existir a competição com as outras áreas.

Eu sempre conto da minha primeira experiência como gestor na Secretaria de Cultura do Rio de Janeiro. Quando entramos no governo, minha primeira reunião foi para discutir a programação do Teatro Municipal. Ela estava anunciada, toda vendida, assinantes todos prontos. Essa primeira reunião foi para discutir a programação do ballet Romeu e Julieta, sob a regência do grande Rostropovich e coreografia do Vassiliev (do Bolshoi). Maestro e coreografia russos, ballet e orquestra do Municipal. Então, a produtora fala: "todos os artistas internacionais abandonarão o projeto caso não recebam a parcela contratual, precisamos pagar a primeira parcela!" Era uma coisa absurda, R$ 2 milhões.

Lá fui eu para o nosso secretário de Fazenda. Foi essa minha estréia como gestor público. Cheguei na ante sala e estavam os secretários da Educação e da Segurança conversando, agoniados com suas questões. Ouvi do secretário de segurança que ele precisava de munição para a polícia subir o morro - era o período do Elias Maluco. A da educação levantou a questão da merenda escolar. Quando os dois olharam para mim para perguntar qual o motivo que tinha me levado até lá, eu não tive coragem de falar. Voltei para o Municipal e pensei "caramba, como vou falar que quero dinheiro para o Romeu e Julieta diante dessas circunstâncias?" Aí, chego no teatro e ouço da produtora: “Mas a estréia é mais urgente, secretário! A merenda e a munição você adia. Uma estréia como essa, do Romeu e Julieta, não se adia nunca...”

Esse é um exemplo. Na realidade a gente não tem impregnado nas questões da política pública a transversalidade. Hoje, eu vejo que na questão da UPPs (Unidade de Polícia Pacificadora) no Rio, a presença da cultura é fundamental. Se você não trabalhar em conjunto a área da cultura, ela fica como pedinte das demais cujas causas são mais urgentes. No Rio, tivemos aquele desastre que foi a Cidade da Música, um elefante branco do César Maia, inaugurado sem acabar! Um dinheiro enorme gasto numa obra parada que seria hoje muito significativa para a cultura nacional, na cidade do Rio.

As primeiras contestações a esse projeto eram “por que não se investiu em hospital, em escolas? Concordo, mas aquele investimento foi feito para aquilo e tinha que ser terminado.

[ Zé Dirceu ] Em relação ao ticket cultura, isso vai pegar?

[ Grassi ] Essa é uma das estratégias importantes para trabalharmos a distribuição, porque ela inverte a relação. Se você me perguntar: "como produtor, você prefere que eu te dê 1 milhão para a produção da sua peça ou 200 mil pessoas? Eu prefiro 200 mil pessoas. Quero público. Essa é a questão, porque o patrimônio não pode ser a sua produção, mas o seu público. E o vale cultura investe nessa relação.

[ Zé Dirceu ] Grassi, para finalizarmos, qual a perspectiva do artista hoje em relação às novas mídias. Elas são aliadas, concorrentes, já estão ou vão potencializar o trabalho artístico-cultural?

[ Grassi ] Elas são complementares. Temos que tomar posse dessas novas tecnologias e aprender a trabalhar com cada uma de suas linguagens. Acredito que assim como o cinema aprendeu com a televisão - que tem um caminho e uma linguagem próprios - as novas mídias trazem um desafio. Esse é um processo que teremos que somar e aprender a lidar com ele. Mas, no geral, avalio que os artistas estão lidando bem com elas.


---- extraída, autorizadamente, do Blog do Zé Dirceu em 02/11/10, cujo endereço é: http://www.zedirceu.com.br/